terça-feira, 24 de novembro de 2009

* Tráfico e Travessia Transatlântica

O tráfico transatlântico pode ter sido invenção européia, mas a efetiva captura e comercialização de escravos foi o resultado de um complexo jogo de interações e continuidades históricas, pois lógicas bastante distintas justificavam a prática da escravidão entre os africanos e os europeus. É preciso notar a importância dos chefes africanos nesse processo de apreensão de escravos, tanto para mantê-los na África, como para comercializá-los com os europeus.

Nos primeiros anos, os navegadores portugueses utilizaram de extrema violência para capturar os negros. Mas, logo perceberam que não possuíam meios de obrigar os africanos a participar desse comércio contra sua vontade e que havia na África uma abundância de escravos e a vontade africana de comercializá-los. Por isso, iniciaram-se as trocas pacíficas de produtos europeus por escravos, que caracterizaram esse comércio como uma atividade voluntária e que contou com a participação dos líderes africanos.

Pode-se argumentar que, nos séculos XV e XVI, não havia a enorme demanda escravista que ocorrerá por ocasião da colonização da América, por isso o pouco interesse em reduzir sistematicamente um grande número de africanos à escravidão. Há porém a continuidade de uma prática seletiva, de distinção entre africanos que podem ou não ser escravizados, nas diversas regiões do continente nos séculos seguintes, o que aponta para a existência de outra lógica no abastecimento de escravos, além do fator econômico da demanda.

A trajetória do negro, desde sua captura no interior da África até o seu desembarque no outro lado do Atlântico era marcada por condições penosas. Nos navios a superlotação, a ignorância e o nível dos meios técnicos disponíveis na época aliados ao comportamento humano - que nesse comércio negreiro punha em ação homens com sensibilidade pouco desenvolvida e que atribuíam pouco valor à vida humana contribuíam para as precárias condições a bordo.
Estimativas do historiador Joseph Miller mostram que de cada 100 escravos capturados em Angola, 36 morriam na trajetória até a costa, 7 à espera do embarque nos negreiros, 6 faleciam durante a travessia e 23 não sobreviviam aos primeiros anos no Brasil, ou seja, 72 % dos escravos pereciam nos quatro primeiros anos desde a sua escravização.

O tráfico transatlântico deixava graves seqüelas físicas e psicológicas, a angstia e a ausência de esperança associados a grande debilidade física podia resultar no que os contemporâneos chamavam de banzo, um estado psíquico de profunda melancolia e abatimento no qual o escravo se recusava a viver. No outro extremo dessa situação a angústia dos escravos recém-embarcados poderia resultar não na apatia, mas sim na revolta.

Até o século XVII, os  principais portos de embarque de escravos destinados ao tráfico transatlântico eram na Senegâmbia e Golfo da Guiné. No entanto, a partir de 1610, a América, inclusive o Brasil, que recebiam até então escravos desses portos passaram a ser abastecidos de escravos oriundos do porto de Angola. Logo, Luanda tornou-se a capital do tráfico e a partir do século XVII esse comércio sofreu um crescimento exponencial, sendo a América o principal destino desses cativos.

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